quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Reflexões sobre o 42° aniversário da tragédia

Placa Memorial que fica no lugar
onde um dia foi Jonestown

Quando leio sobre o dia final de Jonestown, eu tenho uma mistura de sentimentos. Sinto raiva por terem morrido, tristeza e confusão. 

Racionalmente eu entendo o que aconteceu: Naquele dia estavam isolados do mundo exterior, com uma alimentação ruim e sendo privados de sono. Naquele dia 18 de novembro eles já tinham ensaiado o suicídio diversas vezes e durante os sermões, Jim falava tanto sobre o "suicídio revolucionário"  que chegava a ser maçante. Se isso tudo não fosse suficiente para condicionar a pessoa a desejar morrer, os guardas armados estavam ali para impedir que ninguém fugisse. 

Ainda assim eu ainda me pergunto, será que realmente acreditavam que a morte era a melhor escolha? Será que acreditavam em reencarnação, assim como Jim, que estariam todos juntos novamente após a morte? 

Uma pergunta fica piscando na minha mente, porque não tentaram fugir? Se fosse um ou dois poderiam ser impedidos, mas 20, 30 de uma vez, não. Eu sei a resposta disso, eles já tinham feito outros ensaios antes, "venham todos para o Pavilhão, beber esse suco e morrer juntos", já tinham bebido e descoberto que era um truque. Acredito que no início pensaram que era isso, só após a morte das crianças que viram que era real. Como abandonar o local após as crianças estarem morrendo? O senso de camaradagem era imenso, afinal, além da camaradagem normal no estilo: "construímos tudo isso juntos, estamos lutando juntos para criar uma vida melhor", ainda existia aquela urgência do "nós contra eles", que era instigada por Jim Jones, "nossa comunidade, uma família unida, contra todo o resto do mundo que busca nos destruir".

Todos falam muito sobre Jim Jones ter ordenado as mortes, de fato é verdade, mas ele não foi o único responsável. Para o plano funcionar muitas outras pessoas foram necessárias: aquelas que transportaram o cianeto, o médico que fez testes em porcos e depois calculou a quantidade necessária para matar 1000 pessoas, as enfermeiras que colocaram o líquido na boca das crianças, os guardas que seguraram armas contra a população, os guardas que foram até a pista de pouso atirar no congressista e nos jornalistas.

Jim estava cada vez mais doente, tanto fisicamente quanto mentalmente. Cada vez mais perdido em sua paranóia. Deveria ter sido parado por alguém, mas infelizmente isso não aconteceu. Penso se pessoas como Carolyn Layton, Maria Katsaris e Harriet Tropp realmente acreditavam que o governo estava prestes a invadir e matar a população. Se acreditavam, qual era a base dessa crença? 

Eu acredito que mais cedo ou mais tarde o governo da Guiana ia se cansar do constrangimento internacional que Jim Jones estava trazendo ou que o governo americano, aquele mesmo que promoveu a queda de governos progressistas e financiou ditaduras por toda América Latina, iria se cansar de ter um grupo de 1000 pessoas auto-intituladas comunistas em seu quintal e iria decidir fazer algo a respeito. Ainda assim, fariam algo no sentido de prender (ou matar  como fizeram com alguns líderes dos Panteras Negras) Jim Jones e a liderança, não torturar e matar toda a  população. 

Parece provável que tanto Jim Jones quanto seu círculo interno soubessem que Jonestown era inviável. O governo não estava à porta para prendê-lo, mas era possível que estivesse no futuro. A fazenda não produzia alimentos suficientes, os animais que estavam sendo criados, como porcos e galinhas, também morriam aos montes e não eram suficientes para alimentar toda população, haviam diversos processos judiciais, tanto para recuperar crianças que estavam em Jonestown indevidamente quanto para recuperar bens que foram doados à Igreja. Por fim, tinham diversas pessoas que queriam ir embora e quando chegassem nos Estados Unidos iriam contar sobre as condições de vida de Jonestown: a má alimentação e tortura psicológica provocada por Jones quase todos os dias. 

Parece que a liderança perdeu a perspectiva. Eles perceberam que não seria possível vencer tudo isso e ao invés de voltar aos Estados Unidos e admitir que o projeto fracassou era melhor morrer fazendo uma espécie de protesto, tentando fazer com que tudo que viveram até ali tivesse um grande significado e fosse mais do que um mero fracasso. 

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Já tem pouco mais de um ano que tenho estudado sobre Jonestown, e conheço algumas das pessoas que viveram lá pelo nome. É impossível não ficar imaginando o que algumas pessoas naquele momento pensavam. 

O que Tom Grubbs, que em julho era visto constantemente olhando para a floresta, confrontou Jim e em outubro foi internado após dizer que Jim estava tentando fazer uma lavagem cerebral, pensou naquele dia final? Será que ele foi dopado para não arranjar problemas, assim como Gene Chaikin? Se não, o que estava pensando? Também achou que a morte era a única escolha? Nas fotos tiradas após o dia 18, é possível ver vários arcos e flechas espalhados. Tom era quem treinava o grupo de arco e flecha. Será que no início ele imaginou que poderia ser usado para esse fim? Acredito que não. Deve ter sido terrível essa constatação. 

Penso em Bruce e William Oliver, sua mãe os visitou no dia anterior. Será que eles se arrependeram de não ter deixado o local com ela? Será que estavam orgulhosos de poder partir junto do restante de sua comunidade? Normalmente eles eram seguranças, será que eram um daqueles guardas armados que estavam ao redor do Pavilhão?

Penso em Dick Tropp, Don Sly, Chris Rozynko, Edith Roller e também naqueles que não tiveram seus nomes mencionados em livros sobre o assunto. Penso em todas as crianças e idosos que foram para lá acreditando que seria a terra prometida.  

Eu lamento imensamente a morte de todos eles. Gostaria TANTO que Jonestown tivesse dado certo! Foi um projeto imenso! Você consegue se imaginar abandonando seu emprego e família, se mudando para um país de terceiro mundo, sem a menor garantia que vai dar certo, devido a um sonho. Um sonho de criar uma nova sociedade, justa e igualitária. Foi necessário uma coragem imensa para participar disso! Eu sempre admirei e continuo admirando todos aqueles que estão inconformados com toda a desigualdade existente, que acreditam que é possível criar uma nova sociedade e trabalham para isso.

Se tratando de Jonestown eu sempre me lembro de uma frase que li num livro uma vez: 

"As últimas palavras de Thomas Edison foram: 'É muito bonito lá'. Eu não sei onde é lá, mas eu acredito que exista, e espero que seja lindo!"

De todo coração eu espero que tenham encontrado a paz que tanto procuravam em vida e que não foi possível de encontrar na América e em Jonestown. 

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Carta de Tom Grubbs a Jim Jones - Programa de Substituição de Valor

Eu traduzi uma carta que Tom Grubbs enviou para Jim Jones em novembro de 1977. Além de ser professor e diretor da escola primária de Jonestown, Tom também estudava psicologia, em especial psicologia educacional. Essa carta é uma resposta sobre um programa de substituição de valores. Como substituir a teimosia, raiva, desonestidade por novos valores em indivíduos dissidentes? São analisados alguns métodos e no final, Tom fala sobre sobre o método que seria conhecido como a Caixa. Apesar de ter entrado para história como algo bárbaro, esse não era seu objetivo inicial.


"Para: Pai

De: Tom Grubbs

Re: Programa de substituição de valor

Data: 9 de novembro de 1977


O princípio sobre o qual funciona a substituição de valor é que os sistemas de valores, na verdade todos os quadros de referência para a maioria das pessoas, são mantidos pela percepção, pelo estímulo. A pesquisa e a experiência comprovam de forma conclusiva que as pessoas privadas de estimulação tornam-se muito dóceis e tratáveis.

A tendência em todas as “lavagens cerebrais” está longe de qualquer tipo de administração de dor, pois gera fortes reforços para o “conjunto” mental. Em vez disso, o conforto reduz a resistência à reprogramação ou substituição de valor. Os níveis variáveis ​​de intensidade produzem resultados variáveis ​​ao longo de um tempo variável.

Um método utiliza a deficiência do complexo de vitamina B. A vitamina B é considerada a vitamina do cérebro e dos nervos e foi considerada muito influente na quantidade de perseverança e / ou teimosia que o indivíduo exibe.

Em segundo lugar, a quantidade de privação sensorial influencia o tempo necessário para atingir a plasticidade. Em um espaço escuro, em colchões, à prova de som, com as mãos e os pés acolchoados (dedos das mãos e pés são os principais sensores táteis) a pessoa geralmente experimenta degeneração das funções de raciocínio em cerca de 72 horas. Esse processo geralmente é indicado por alucinações e sinalizado por gritos frequentes. A maioria das pessoas neste ponto não é capaz de controlar as alucinações. No entanto, o monitor pode controlar as alucinações, fornecendo estímulos cuidadosamente selecionados para determinados

[folha 2]

períodos. O sujeito está livre das alucinações enquanto atende ou se concentra no estímulo e seus aspectos relacionados. O resultado delas é que com um cronograma adequado, o sujeito passa a desejar os estímulos e passa a depender deles para a liberdade da sensação de estar perdido, descentrado, sem verificação da identidade. A verificação de identidade é um conceito importante. Eles seguiriam que pessoas com autoconceitos (imagens) pouco desenvolvidos são mais suscetíveis a esse processo.

Quanto mais estímulos livres, menor o período necessário para reduzir a resistência à substituição de valor.

Programar os intervalos entre, duração e conteúdo da fase de redesenvolvimento é o mais importante. O estágio de redesenvolvimento inicial deve ter os períodos mais curtos de valor pré-estatístico e espaçados em intervalos mais longos. Os períodos tornaram-se mais longos e frequentes à medida que a sujeito mostra progresso na internalização dos novos valores. Assim, os períodos de discussão são recompensas pelo progresso.

É importante que o inspetor perceba que o sujeito é bastante sugestionável durante a fase de redesenvolvimento e este período requer considerável reflexão e planejamento antes da implementação. Além disso, a conversa não diretamente relacionada aos valores desejados é reduzida ao mínimo. Nas fases posteriores, pode ser aumentado como recompensa.

A instalação deve ser grande o suficiente para não causar claustrofobia, digamos 6x6x6 no mínimo. Deve ser bem apertado e em uma área sem som. O chão deve ser coberto com colchões. É desejável, embora não obrigatório, tampar as paredes com colchões.

Um método inclui o uso de uma camisa de contenção e apoios para os pés. O processo é acelerado, embora provavelmente mais traumático. Podemos não desejar este procedimento.

O processo pode ser concluído de 5 a 7 dias."

Fonte:      

People Temple Files Recovered by FBI 

Letters to Jim Jones

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Acomodações e Prédios - Parte 5


  • Cabana de Jim Jones
"A isolar casa de dois cômodos de Jones foi construída sob uma colina e duas vezes maior do que as outras casas. Sua casa era mobiliada com uma pequena geladeira para guardar seus Pepsis diet, comidas e remédios, tinha ar-condicionado e uma varanda com tela para proteger do calor e dos insetos. " - Trecho do livro Mil Vidas, capítulo 9

Todas as fotos da cabana foram tiradas após 18 de novembro.







   


  • Casas de Troolie
Haviam seis casas Troolie, algumas eram residências particulares e outras moravam grupos de idosos. Era lá que Marceline Jones, esposa de Jim Jones, morava com Stephan, filho do casal.
 
Essas casas dessa forma devido as suas paredes serem de folhas de palmeira troolie trançadas. Ficavam próxima ao pavilhão e aos prédios médicos.




  • Dormitórios
Os dormitórios eram bem maiores que os chalés e como a casa Troolie. Cada dormitório abrigava de 30 a 50 pessoas e três deles eram exclusivos para idosos. O dormitório 3 funcionava como berçário. Um deles também abrigava adolescentes e adultos que estavam na Equipe de Aprendizagem.


Dormitório 2




Foto tirada em 1979. É possível ver dois dormitórios 
e os prédios dos chuveiros à esquerda.

  • Escritório de enfermagem / enfermaria




  • Fármacia (Interior)