Existem muitos mistérios que rondam o dia final de Jonestown, um deles é como Jim Jones, através de sua influência, conseguiu transformar pessoas comuns em assassinas.
O Templo dos Povos se tornou uma espécie de religião que misturava cristianismo, socialismo primitivo e um forte senso de perseguição, não é a toa que chamavam Jonestown de Terra Prometida: era, ou pelo menos deveria ser, um refúgio da sociedade americana.
No início, o apelo era sobre uma guerra nuclear que iria acontecer em breve. Com o passar do tempo isso mudou. Acusaram os ex-membros, familiares, a mídia e depois afirmaram estarem sendo perseguidos pelo próprio governo.
Esse sentimento de nós contra eles já existia nos Estados Unidos e servia para unir o grupo, porém quando chegou na Guiana escalou ao ponto de não enxergarem outra saída além da morte para ficarem longe do assédio da parte do governo e de familiares.
Em Jonestown aconteceu uma banalização da violência e da morte. Além dos muitos sermões em que Jim Jones constantemente exortava contra todos aqueles que, segundo ele, queriam destruí-los, os moradores também eram instruídos a escreverem cartas com planos de como poderiam destruir os inimigos. Através dessas cartas podemos ver pessoas falando sobre detonar bombas no congresso, derrubar aviões ou envenenar os adversários.
Assim como as noites brancas transformam a ideia de suicídio em massa em algo comum, que iria acontecer mais cedo ou mais tarde, todas os sermões, cartas e testemunhos feitos a favor da morte dos inimigos transformavam isso em algo normal, que iria acontecer algum dia. Destruir os adversários do Templo deveria ser algo para se orgulhar, significava que Jim Jones teve confiança suficiente para designar para essa missão tão importante.
* * *
No dia 18 de novembro de 1978, após a equipe do congressista, membros da mídia e cerca de 20 membros deixarem Jonestown, Jim Jones convocou diversos guardas para executarem os traidores.O repórter Tim Reiterman que foi para Jonestown junto da equipe de imprensa escreveu um artigo sobre o que aconteceu na pista de pouso:
"Enquanto caminhávamos para a pista, um pequeno Cessna para seis passageiros estava estacionado ao lado da cabana de metal corrugado que servia como terminal do aeroporto.
Um segundo avião, um avião da Guyana Airways de 24 lugares, estava chegando para um pouso.
Quando o avião maior pousou, o caminhão do templo, com várias pessoas na traseira, começou a avançar. Ao lado dele, havia um trator e um trailer atribuídos anteriormente na missão.
Alguns dos que saíram do templo olharam os veículos com desconfiança. O repórter da NBC, Don Harris, disse friamente: "Acho que teremos alguns problemas."
Primeiro, o Cessna foi preenchido, com Ryan revistando cada interno em busca de armas e facas.
Enquanto isso, o trator, com vários homens no trailer, rolou em direção à cabana do terminal e parou a uma curta distância. Silenciosamente, os homens com o trator afastaram um grupo de crianças guianenses curiosas e outros espectadores.
“Parece um problema”, eu disse a Greg Robinson, mas ele continuou tirando fotos.
O mais rápido possível, Jacqueline Speier estava sinalizando os passageiros no boba da escada de embarque enquanto um repórter a ajudava a verificar as armas. A coisa mais próxima de um oficial da lei - um jovem policial agradável com uma camisa rosa e uma espingarda calibre 16 - foi desarmado por membros do templo.
Então, com uma rapidez de parar o coração, o primeiro tiro foi disparado. Não vi quem disparou o tiro, mas o som veio do trator e do trailer.
Uma série de estalos altos ecoou pelo campo.
"Bateu no convés!" alguém gritou enquanto escalávamos o cascalho para o outro lado do avião.
Eles estavam atirando para matar, não apenas para impedir de sair.
[...]Ouvi mais alguns tiros e vi o trator se afastar. Depois que eles saíram, saí do arbusto e vi cinco corpos ao redor do avião. Outras pessoas conhecidas feridas.
O corpo de Greg estava perto dos degraus de embarque com sua bolsa e câmeras espalhadas ao seu redor. Havia uma ferida aberta em seu ombro e possivelmente em suas costelas.
Ryan, com os cabelos grisalhos ensanguentados, estava perto da frente do avião. Harris, um repórter investigativo da NBC sediado em Los Angeles que cobriu a queda de Saigon e a rebelião da Nicarágua, foi morto. Foi Harris quem foi contatado pelos primeiros dois grupos de membros do templo que expressaram o desejo de partir.
Também estava morto Bob Brown, o cinegrafista da NBC e o tipo de cara que amava histórias de ação.
Patricia Parks teve a cabeça despedaçada diante dos olhos do marido. "
* * *
Ainda existem algumas dúvidas sobre as identidades dos atiradores de Port Kaituma. Certamente alguns, provavelmente a maioria deles estavam envolvidos. Todos os homens nomeados pelo FBI morreram naquele mesmo dia após tomarem veneno.
A investigação oficial do FBI sobre o assassinato do congressista Leo Ryan, RYMUR 89-4286168, e duas outras listas feitas posteriormente indicam as pessoas a seguir pelo ataque na pista de pouso:
"Ele [Gosney] e os outros estavam no pequeno avião. A essa altura, o trator e o caminhão voltaram para a pista de pouso e passaram pelo pequeno avião e foram diretamente para as proximidades do local do grande avião, circulando-o uma vez. No trator, Gosney notou Joe Wilson, que segurava um rifle. Wilson começou a atirar e 'continuar atirando nas pessoas, no avião, nos pneus do avião e tudo mais."
Após 18 de novembro, Wanda Johnson, esposa de Tom Kice, deu uma entrevista dizendo que sua família foi uma das primeiras a ingressar no Templo dos Povos depois da mudança de Indiana para Ukiah na década de 1960. Eles cederam ao Templo sua casa de três quartos e os oito acres ao redor, uma nova picape, o carro da família e US $ 2.000 em economias. Wanda disse que seu marido havia ido para Jonestown para resgatar o filho mais novo do casal, Tom Kice Jr, que foi enviado para lá pouco tempo depois que os irmãos mais velhos deixaram o Templo.
Em Jonestown, Tom Kice trabalhou primeiro na construção e depois como segurança particular de Jim Jones.
Charles Krauze foi um jornalista que sobreviveu ao tiroteio na pista de pouso. Ele voltou a Jonestown no dia 20 de novembro para escrever uma matéria chamada "Jonestown Revisited: The Final Horror". Nessa matéria, Krauze fala que:
"[...] Eu queria especialmente encontrar o corpo de Tom Kice, o homem alto, de cabelos grisalhos e corte à escovinha, cuja expressão maldosa e demente nunca esquecerei quando ele cruzou a pista de pouso para nos matar."
Em sua entrevista para o FBI, Dale Parks disse que foi Tom Kice quem atirou uma queima-roupa em Patty Parks , uma única desertora do Templo a ser morta na pista de pouso.
Kice era um velho amigo da família Parks. Já havia, inclusive, falado com Patty Parks que gostaria de deixar Jonestown.
Dom Beck escreveu em seu artigo sobre Anthony Simon:
Anthony Simon veio de Los Angeles e foi um dos primeiros membros a se voluntariar para ir a Guiana em abril de 1974. Junto com vários outros, o trabalho de Anthony era adquirir, preparar e tripular nosso barco, o Cudjoe, e preparar o caminho para a construção de Jonestown.
Anthony trabalhou no Cudjoe, mas acabou decidindo ser avicultor e supervisou a construção do primeiro galinheiro onde os pintinhos - vindos de Georgetown para Port Kaituma - foram criados.
Herbert Newell, um sobrevivente do massacre, em um artigo para o site Jonestown Institute conta sobre a conversa que teve com Crenshaw na manhã do dia 18 de novembro:
"Era a manhã de 18 de novembro de 1978 e eu estava em Jonestown. Eu estava esperando para o café da manhã na fila da comida quando fui chamado, junto com Clifford Gieg. Disseram-nos para pegar o barco do Templo, o Cudjoe, levar rio abaixo e voltar no dia seguinte.
Clifford e eu fomos para Port Kaituma no caminhão. O motorista, Ed Crenshaw, nos disse que, quando voltássemos no dia seguinte, ele e os outros estariam mortos, mas que Clifford e eu voltaríamos para os Estados Unidos."
No livro Thousand Lives, a autora conta sobre a amizade de Eddie Crenshaw e Stanley Clayton, um sobrevivente de Jonestown.
"Os dois às vezes falavam sobre fugir de Jonestown. Mas era mais conversa fiada do que qualquer coisa. Estava apenas desabafando. Eddie nunca deixaria sua esposa, Francine, e seu filhinho de um ano."
- Informações como idade, ocupação e familiares foram retiradas do site Jonestown Institute.
- Depoimento de Vernon Gosney para o FBI
- Anguished Mother Tells How Fear Controlled Cult - Entrevista de Wanda Johnson sobre Tom Kice
- Jonestown Revisted: The final horror - Charles Krause
- Kice gostaria de deixar Jonestown: Awake in a nightmare - Ethan Feinsod - Pag. 181
- Anthony Simon and the Jonestown Chicks - Artigo de Don Beck sobre Anthony Simon
- Citação sobre amizade de Stanley Clayton e Eddie Crenshaw: Capítulo 19 do livro Thousand Lives, autora Julia Scheers.
- The couldest day of my life - Artigo de Herbert Newell sobre Eddie Crenshaw
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